Era uma casa muito engraçada. Faltava de tudo, mas sobrava algazarra e muita peraltice de seus inúmeros habitantes: filhos, netos, agregados e vários amigos que nela se instalavam sem data para partir.
Uma esculhambação generalizada se instalara sob o telhado que cobria o velho casebre de meu querido pai para torna-lhe os dias mais suportáveis, já que um AVC o debilitara, sem pena e sem dó!
Mas nessa casa muita engraçada, ocorria, também, muita patifaria, porque nela havia muito cacique pra pouco índio.
A época em que o AVC o acometera, década de 80, eu morava em SAMPA, mas vez por outra, ou seja, duas vezes por mês eu vinha visitar o meu querido velho, aquele cara meigo e violento que amou todas as mulheres e morreu, entre gardênias e outras “cositas más”, na rua camélia 16, bairro Santo Expedito, hoje bairro: Sagrada Família.
Nessas minhas muitas idas e vindas para visita-lo, sempre flagrava cenas muito hilárias: - Certa feita, ao chegar, inesperadamente, encontrei a tribo toda, inclusive meu velho, reunida na sala de visita, a gargalhar despudoradamente. Então, perguntei-lhes:
- Por que tanta algazarra gente?
Depois de muitos tapas e beijos de cumprimentos inúmeros, meu irmão mais novo me contou o motivo:
- É que, ao eu passar diante do ventilador que refrescava nosso pai, soltei um pum bem fedido, e a catinga foi direto ao seu nariz. Ele pensou que tivesse sido meu amigo que estava sentado à sua esquerda, e voltando-se para o menino, disse-lhe em alto e bom som:
- Tu tá podre!
Então, soltei uma gargalhada espalhafatosa e disse a meu irmão:
- Etá Guilherme, quando é que você irá deixar de fazer estas patifarias?
D`outra feita, meu ônibus não sei porquê, se antecipou ao horário previsto para sua chegada à Montes Claros. Destarte, tal fenômeno me possibilitou flagrar uma belíssima cena em que a alegria de viver era protagonizada pelo meu velho pai.
Ainda sonolento, vez que não durmo quando estou viajando, não percebi, de imediato, um taxi trazendo meu velho para seu casebre. Surpreendi-me, sobremaneira, ao perceber que o velho querido decera do taxi sozinho e aos berros:
- Sou índio!
-Ha ha há...
- Sou índio!
Aproximei-me dele, sorrateiramente, e perguntei-lhe:
- Posso saber o porquê de tamanha euforia?
Ele olhou-me sorridente, abraçou-me...
E disse-me apenas: - Sou índio!
Eu perdia-me em curiosidades. Mas tive que esperar que “Mãe menininha do nosso casebre” acordasse lá por volta das 19, 00 hs, para que ela me relatasse o motivo de tamanha euforia do nosso amado velho.
Confesso que o bendito mantra paterno – “eu sou índio!” - martelou-me a mente durante o transcorrer do dia inteirinho, e transformou a espera da noite num verdadeiro tormento, vez que cabia a mim conter a voraz curiosidade que em mim pululava sedenta.
Enfim, a noite chegara trazendo consigo a elucidação do bendito mantra do meu velho querido:
-Eu sou índio!
Tal mantra significaria um grito de vitoria:
Tive, num motel da Ponte Branca, uma excelente performance jovial.
Ah! Meu querido velho era muito matreiro mesmo!
Bom... o negocio é caciquear, porque filho de índio é curumim!
Durmam com está!
Montes Claros, (MG), 14-01-2015
RELMendes
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